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Política Portuguesa

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POLÍTICA PORTUGUESA
  • Políticas da droga em Portugal

    Tal como na maioria dos países a história da evolução das políticas da droga em Portugal começa a desenhar-se na primeira metade do século 20 com a transposição para a legislação nacional das disposições e recomendações introduzidas pela Convenção Internacional do Ópio, assinada em Haia, em 23 de janeiro de 1912. Assim a primeira legislação publicada em Portugal em matéria de drogas data de 1924, com a aprovação da Lei n.º 1 687, regulamentada pelo Decreto n.º 10 375, de 9 de dezembro. Este diploma apenas virá a ser revogado pelo Decreto-Lei n.º 420/70, de 3 de setembro. No que respeita ao Tratamento, em 1963, a Lei de Saúde Mental (Lei n.º 2118, de 3 de abril), já se referia ao "tratamento das toxicomanias" no entanto, não havia nenhuma estrutura para o efetivar. 

    Em Portugal, o fenómeno do uso/abuso de produtos psicotrópicos e substâncias estupefacientes inicia-se, mas sem a expressão e o impacto social do fenómeno noutros países da europa, a partir do início dos anos 70. É a partir desta altura que são dados os primeiros passos no sentido de criar uma resposta pública a esta problemática, nomeadamente através da criação, em 1973, de uma consulta específica de toxicodependência, no Serviço de Psiquiatria do Hospital de Santa Maria, em Lisboa. 

    É apenas em 1975, na dependência da Presidência do Conselho de Ministros, que são criadas as primeiras estruturas para fazer face a este novo fenómeno, nomeadamente o Centro de Estudos da Juventude, ao qual competia uma vertente mais preventiva e de tratamento médico-social, e o Centro de Investigação Judiciária da Droga, com atuação na área da repressão e fiscalização do tráfico ilícito de drogas. Já em 1976 é extinto o Centro de Estudos da Juventude, dando lugar à criação do Centro de Estudos da Profilaxia da Droga, com competências nos domínios da prevenção, tratamento e inserção social do toxicodependente. O Centro de Investigação Judiciária da Droga é extinto dando lugar à criação do Centro de Investigação e Controle da Droga, com competência na área da repressão do tráfico ilícito de drogas. Estes dois organismos passam a ser coordenados por um terceiro, o Gabinete Coordenador do Combate à Droga, ao qual competia a coordenação das atividades por estes desenvolvidos sob a tutela do Ministério da Justiça. 

    É já nos anos 90 que se inicia uma transição, ainda que a Coordenação Nacional desta área se mantivesse na Presidência do Conselho de Ministros através do Projeto VIDA, das respostas de prevenção, tratamento reinserção para a área da saúde, nomeadamente, com a criação, no Ministério da Saúde do Serviço de Prevenção e Tratamento da Toxicodependência e subsequente aprovação da Lei n.º 7/97, de 8 de março que procedeu ao alargamento da rede de serviços públicos para o tratamento e reinserção de toxicodependentes, por forma a garantir o acesso a cuidados de prevenção, tratamento e reinserção social e profissional de todos os cidadãos afetados pela toxicodependência. 

    No, entanto, e não obstante terem sido criadas várias respostas nesta área, Portugal enfrenta, no final dos anos noventa, um grave problema social e de saúde pública, por causa do fenómeno da toxicodependência, em particular no que diz respeito ao consumo problemático de heroína. As estimativas apontavam para um número muito próximo dos 100 mil utilizadores de heroína - uma população altamente fragilizada do ponto de vista social, na sua maioria com consumos por via endovenosa. O problema da toxicodependência tornou-se uma das principais preocupações portuguesas, num estudo do Eurobarómetro, realizado em 1997, os portugueses indicavam as questões relacionadas com a droga como o principal problema social do país. Doze anos depois, em 2009, as drogas e a toxicodependência passam a ocupar o 13º lugar nesta lista.

  • O que é que mudou?

    No final dos anos 90, o governo português convidou um comité de peritos, ligados a diversas áreas, para elaborar um relatório aprofundado da situação e que, ao mesmo tempo, contivesse recomendações de vária ordem que pudesse enformar, pela primeira vez, a elaboração de uma estratégia de intervenção global que norteasse toda a intervenção nesta área, de forma coerente e sustentada. Assim é, aprovada pelo governo, através da Resolução do Conselho de Ministros 46/99, de 22 de abril, a primeira Estratégia Nacional de Luta Contra a Droga e a Toxicodependência para um horizonte temporal de 1999 a 2004. 

    Inicia-se um novo ciclo na área da política portuguesa em matéria de drogas e dependências. 

    Para além de outras medidas extremamente importantes das grandes alterações introduzidas pela Estratégia Nacional a mais emblemática, terá sido a descriminalização do consumo de todas as substâncias psicoativas através da aprovação da Lei n.º 30/2000, de 29 de novembro que define o regime jurídico aplicável ao consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, bem como a proteção sanitária e social das pessoas que consomem tais substâncias sem prescrição médica e, posteriormente, no Decreto-Lei n.º 130-A/2001, de 23 de abril que permitiu deixar de se considerar crime o consumo de droga, a aquisição e a posse para consumo próprio. Para aplicar esta nova Lei foram criadas as Comissões para a Dissuasão da Toxicodependência, as quais vieram substituir os tribunais criminais como resposta do Estado ao consumo de drogas. Estas comissões, constituídas por um colégio de técnicos da área da saúde e da justiça, mas sempre presididas pela saúde, procuram informar as pessoas e dissuadi-las de consumir drogas. Têm, também, o poder de aplicar sanções administrativas e de encaminhar pessoas para tratamento, sempre com o seu consentimento. 

    No entanto, a abordagem às dependências em Portugal, não ficou apenas pela descriminalização do consumo de drogas, para além do reforço de toda a intervenção já existente nas áreas da prevenção, tratamento e reinserção foram, também, criadas, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 183/2001 de 21 de junho, respostas na área da redução de riscos e minimização de danos (RRMD), tais como, Equipas de Rua, Gabinetes de Apoio, Programas de Substituição Opiácea de Baixo Limiar de Exigência, Centros de Acolhimento, Centros de Abrigo com inclusão de equipas técnicas na área das dependências e Pontos de Contacto e Informação e que hoje constituem a Rede Nacional de RRMD. 

    Todo este trabalho, com um profundo impacto na relação dos vários serviços ligados a esta problemática junto da população de utilizadores de drogas, só foi possível porque, ao existir um Estratégia Nacional aglutinadora de toda a intervenção, foi, também, criado o Conselho Coordenador da Estratégia Nacional de Luta Contra a Droga e da Toxicodependência, com o objetivo de assegurar a coordenação da política do Governo em todas as áreas em que se divide a estratégia, bem como se assistiu à valorização do Conselho Nacional da Droga que, ao ver alargadas as suas competências e composição, passou a designar-se Conselho Nacional da Droga e da Toxicodependência, órgão de consulta sobre a política pública de droga e toxicodependência, ao qual compete pronunciar-se sobre a definição e execução da Estratégia Nacional de Luta contra a Droga. O Conselho Nacional assume, também, um papel preponderante no envolvimento dos vários parceiros públicos, bem como permite definir toda uma linha de atuação balanceada entre a redução da oferta e a redução da procura, procurando identificar pontos de convergência entre os vários atores envolvidos, garantindo assim a coerência e sustentabilidade no planeamento, implementação, monitorização e avaliação das políticas públicas para esta área. 

    Em 2004, procedeu-se à avaliação interna e externa da Estratégia Nacional de Luta Contra a Droga e a Toxicodependência, bem como ao início do desenho de um novo ciclo estratégico 2005-2012. Desta avaliação, resultaram recomendações que foram tidas em linha de conta na elaboração do Plano Nacional de Luta Contra a Droga e a Toxicodependência Horizonte 2012, no entanto, mantiveram-se como principal referência os princípios enunciados na Estratégia de 1999, nomeadamente os princípios do humanismo e pragmatismo, tendo sido incluídos os princípios da centralidade no cidadão, da territorialidade e das respostas integradas. 

    Das principais alterações efetuadas é o reforço da coordenação e integração das respostas a nível local que assume maior expressão. Mantendo uma lógica de proximidade à comunidade, todo o trabalho de intervenção nas dependências foi sendo desenvolvido, através da criação de uma rede de respostas integradas e complementares ao fenómeno do uso e abuso de substâncias psicoativas, numa base territorial preconizada pelos Centros de Respostas Integradas (CRI), os quais se constituem com unidades de intervenção local de cariz operativo, referenciados a um território definido e que dispõem de equipas técnicas especializadas para as diversas áreas de intervenção, nomeadamente, tratamento, prevenção, reinserção e redução de riscos e minimização de danos. De salientar, ainda, o papel fundamental que estas unidades assumiram junto da comunidade, possibilitando o conhecimento aprofundado das necessidades, a mobilização de recursos existentes e a estruturação de respostas adequadas às especificidades do seu território. 

    Assim, no ciclo estratégico que agora termina, o principal enfoque da atuação foi a expansão das respostas, tendo em conta a proximidade ao cidadão e as suas necessidades, a reorganização territorial dos serviços respeitando as especificidades da comunidade a eles associados e a complementaridade e integração das respostas em função de diagnósticos locais que permitiram basear nesse trabalho a definição das prioridades de intervenção a nível nacional. 

    Ainda a nível da organização territorial da intervenção (Regional e Local), procurou desenvolver-se um modelo de gestão desconcentrada, onde os diversos vetores de intervenção se entrecruzassem. 

    A prevenção, área onde o principal objetivo é a intervenção sobre as causas do fenómeno, procurando que este não venha a manifestar-se futuramente, fomentando não apenas o conhecimento sobre o fenómeno, mas também exponenciando a abrangência, eficácia, eficiência e qualidade dos programas de prevenção implementados. 

    O tratamento, área que evidência a rede de recursos de saúde e sócio sanitários, públicos e privados, promotores da prestação de programas de cuidados à população com consumos problemáticos de drogas, baseados em abordagens terapêuticas multidisciplinares integradas, articuladas e complementares. 

    A redução de riscos e minimização de danos, vetor que assume como princípio fundamental uma abordagem pragmática e humanista ao fenómeno da toxicodependência. Numa perspetiva de saúde pública, em que o objetivo e independentemente do uso de drogas em si mesmo, é focalizar a intervenção nas consequências, de saúde e sociais, que decorrem desse consumo ou seja, ainda que se procure privilegiar a redução dos riscos associados,  deverá sempre ter-se em conta, por força de uma atitude pragmática, a minimização dos danos associados a esse mesmo consumo. 

    A reinserção social intervenção que redunda em processos de socialização e/ou ressocialização e na procura da construção de um projeto de vida sustentado, orientado para a realização pessoal, através do envolvimento do agregado familiar e da comunidade em geral. 

    A dissuasão decorre da aplicação do quadro legal vigente (Lei nº 30/2000, de 29 de novembro e complementares), assentando numa perspetiva de descriminalização do comportamento de uso, potenciando a responsabilização pessoal através da aplicação de medidas sancionatórias à população consumidora, em alternativa a medidas que na sua essência são consideradas mais punitivas. 

    Neste quadro evolutivo importa destacar algumas das intervenções que se tornaram, também, de alguma forma, emblemáticas, nomeadamente, a criação e implementação do Programa Operacional de Respostas Integradas (PORI) o qual se constituiu como uma medida estruturante de âmbito nacional promovendo a intervenção integrada no âmbito do consumo de substâncias psicoativas, privilegiando a existência de diagnósticos rigorosos que fundamentam a contratualização a terceiros (ONG) de repostas e intervenções em territórios identificados como prioritários. 

    A sua operacionalização, obedeceu à implementação de fases sequenciais e foi efetivada com a criação de Programas de Respostas Integradas (PRI) em cada território, integrando respostas interdisciplinares de prevenção, tratamento, redução de riscos e minimização de danos, tratamento e reinserção. 

    O PORI, através da implementação de PRI, apontou para uma nova abordagem territorial visando reorganizar as intervenções existentes, em conjunto com as entidades locais, por forma a rentabilizar e potenciar os recursos disponíveis. 

    Outra das medidas que assumiu particular expressão durante este ciclo estratégico foi a elaboração e implementação do Plano de Ação Nacional de Combate à Propagação de Doenças Infeciosas em Meio Prisional, operacionalizado em cinco áreas de intervenção: promoção da saúde e prevenção da doença, tratamento da toxicodependência, tuberculose, doenças infeciosas virais, redução de riscos e minimização de danos. De facto, embora a ação que ganhou maior evidência pública no âmbito desta intervenção tenha sido a implementação de um programa específico de troca de seringas, desde o primeiro momento que esta componente de RRMD foi integrada numa estratégia mais abrangente. O PETS foi implementado em setembro de 2007, através de um Projeto Piloto, em dois Estabelecimentos Prisionais. 

    Importa, também, referir alguns dos ganhos obtidos ao longo do ciclo estratégico que agora finda, redução considerável do numero de utilizadores problemáticos de drogas, nomeadamente com a redução dos consumos por via endovenosa, redução significativa no número de novas infeções pelo VIH, redução do numero de overdoses e considerável aumento do numero de novos utentes nas estruturas convencionais de tratamento da toxicodependência o que pode significar que o trabalho de proximidade, efetuado junto dos consumidores sem enquadramento sócio familiar, permitiu uma capacidade de vinculação destes a programas de tratamento mais estruturados até aqui inexistente. 

    Do ponto de vista da organização e operacionalização de toda esta intervenção, Portugal tinha como entidade impulsionadora de toda esta dinâmica o Instituto da Droga e da Toxicodependência - IDT, I.P. 

    O IDT, I.P., extinto com a publicação da nova lei orgânica do Ministério da Saúde, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 124/2011, de 29 de dezembro, constituía-se como um organismo tutelado pelo Ministério da Saúde. Esta instituição desenvolvia uma estratégia integrada de combate à droga e à toxicodependência alicerçada na prevenção dos consumos, tratamento e redução de riscos e minimização de danos e reinserção social, assegurando de forma transversal o funcionamento de um sistema nacional de informação sobre droga e toxicodependência, bem como, promovia e estimulava a investigação do fenómeno, apoiando a formação dos profissionais que interviessem neste domínio. Tinha também como responsabilidade o apoio ao funcionamento das comissões para a dissuasão da toxicodependência, assegurando a cooperação com entidades externas, estudando e propondo medidas legislativas e administrativas neste domínio assim como o acompanhamento da sua aplicação. 

    Para a prossecução das suas atribuições, o IDT, I.P. dispunha de Serviços Centrais, Regionais e Locais: 

    • Nível Central, as equipas técnicas dos Serviços Centrais definiam as linhas de orientação técnico-normativas para a prossecução e uniformização do modelo de intervenção a nível nacional. Esta sede de coordenação garantia, de uma forma participada, a unidade intrínseca de todo o processo de acompanhamento e avaliação, realizado a nível local e regional. 
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    • Nível Regional, pela monitorização e avaliação efetuada pelas Delegações Regionais, que concentravam o diagnóstico das necessidades e o acompanhamento dos vários programas a este nível, o que permitia, em tempo real, a adequação da estratégia de intervenção, fazendo face às necessidades específicas de cada região. As Delegações Regionais promoviam a articulação entre as várias intervenções da região, incentivavam a participação dos mesmos, desenvolviam ações em função das prioridades e organizavam o tratamento da informação, permitindo assim a elaboração de indicadores de mudança e de impacto na população. Este acompanhamento concretizava-se, também, através do contacto direto com os vários atores intervenientes ao nível da prevenção, tratamento, redução de riscos e minimização de danos e reinserção, facilitando, desta forma, a articulação e adequação da estratégia, desde o nível local ao nível central. 
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    • Nível Local, em particular através das Unidades Locais o IDT desenvolvia todo um trabalho de intervenção. Para além de toda a intervenção realizada, estas unidades tiveram um papel preponderante na captação e alinhamento dos vários parceiros, numa lógica de atuação local concertada ao nível dos vários tipos de intervenção (prevenção, tratamento, redução de riscos e minimização de danos e reinserção). 

    Este processo permitiu, de uma forma articulada e integrada, acompanhar a evolução do fenómeno a nível nacional, sem perder de vista as especificidade regionais e locais ao nível do planeamento e avaliação das políticas em matéria de droga e toxicodependência. 

    Com a publicação da nova orgânica do Ministério da Saúde, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 124/2011, de 29 de dezembro, o Governo procedeu à criação do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e Dependências (SICAD), extinguindo, em consequência, o Instituto da Droga e da Toxicodependência, I. P., remetendo às Administrações Regionais de Saúde, I.P. a componente de operacionalização das políticas de saúde. 

    O diploma orgânico do SICAD, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 17/2012, de 26 de janeiro, concretiza uma inovação, assente na opção de reforço da componente de planeamento e acompanhamento de programas de redução do consumo de substâncias psicoativas, na prevenção dos comportamentos aditivos e na diminuição das dependências. Por sua vez, a componente de operacionalização das intervenções é concentrada no âmbito de atuação das Administrações Regionais de Saúde (ARS). 

    Embora o SICAD não tenha, agora, responsabilidade direta sobre os serviços de intervenção local, é também para eles que esta instituição desenvolverá instrumentos técnicos normativos e linhas de orientação que garantam e sustentem boas práticas, de forma mais abrangente. Dar-se-á início a um novo ciclo, agora com o alargamento das competências aos comportamentos aditivos e às dependências em geral, o que implicará o envolvimento de novos parceiros, bem de novas estratégias de atuação. 

    O desafio que se coloca ao SICAD, mas também a todos quantos estão envolvidos nesta área é o de, no quadro das mudanças introduzidas e sem perder a qualidade até aqui alcançada, conseguir contribuir para o alargamento do âmbito da intervenção, rentabilizando e potenciando a utilização dos recursos existentes.

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