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 MODELOS, RESPOSTAS E INTERVENÇÕES​

 

O Modelo de Tratamento desenvolvido em Portugal nos serviços públicos do Ministério da Saúde atendeu desde sempre à natureza complexa dos comportamentos aditivos e das dependências, disponibilizando de forma integrada cuidados globais aos utentes que a eles recorriam.
 
Este Modelo de Tratamento Integrado, assente numa abordagem biopsicossocial constitui o principal eixo da abordagem multidisciplinar dos comportamentos aditivos e dependências, em que os diferentes recursos terapêuticos se integram e articulam em momentos simultâneos ou sucessivos de acordo com o diagnóstico, as necessidades e capacidades do utente e da família ou envolventes e o seu prognóstico.
 
As alterações determinadas pela nova lei orgânica do Ministério da Saúde expressas no Decreto – Lei nº 124 /2011, de 29 de dezembro, vieram reforçar aspetos fundamentais deste modelo. O alargamento das respostas aos comportamentos aditivos e dependências aos cuidados de saúde primários permitiu aumentar a possibilidade de intervenção ao longo de todas as fases do ciclo de vida, reforçando a integração desta problemática nos cuidados de saúde a prestar à população em geral. Desta forma, o diagnóstico e intervenção precoce, bem como a possibilidade de referenciação de situações de maior gravidade para estruturas especializadas a partir das consultas de medicina geral e familiar vieram conferir uma maior abrangência de respostas, reforçando a sustentação e implementação deste Modelo Integrado. Assumindo-se nesta nova organização como a porta de entrada preferencial na rede de cuidados de saúde para os comportamentos aditivos e dependências, manteve-se no entanto a possibilidade de o acesso a esta se poder processar diretamente pelas estruturas de tratamento especializadas, aumentando-se assim a acessibilidade ao tratamento.
 
Assim, a nova definição da rede de respostas aos comportamentos aditivos e dependências manteve a característica do modelo no que se refere à natureza da primeira linha de prestação de cuidados em ambulatório, tendo como base a relação estabelecida entre o utente e um técnico de saúde. À sua luz, o início do processo de tratamento pode ocorrer:
 
- Através dos Cuidados de Saúde Primários – Unidades Funcionais: de acordo com a organização de cada Agrupamento de Centros de Saúde, estas consultas podem ocorrer nos vários tipos de Unidades Funcionais existentes. Têm como objetivo a avaliação, diagnóstico precoce dos comportamentos aditivos e dependências, nomeadamente do seu nível de gravidade. A partir deste diagnóstico, em termos de intervenção, está prevista a possibilidade de realização de Intervenções Breves quando o nível de risco avaliado é baixo. Quando é detetada situação de maior gravidade (consumo de risco, consumo nocivo, dependência), destas consultas deverá resultar referenciação através do Médico de Família, para cuidados de saúde especializados no âmbito dos comportamentos aditivos e dependências.
   
-Através dos Cuidados de Saúde Especializados no âmbito dos comportamentos aditivos e dependências: a intervenção em unidades especializadas, resultante de referenciação ou de iniciativa do próprio, determina uma avaliação inicial por médico/psiquiatra. Frequentemente avaliações na área da psicologia, serviço social e enfermagem são igualmente importantes e requeridas. Esta resposta constitui o núcleo da intervenção terapêutica integrada: estabelecida a relação com um técnico de referência, realiza-se o acompanhamento regular do utente o qual se prolongará de forma a assegurar a consistência dos ganhos terapêuticos e a reaquisição das capacidades e competências para o funcionamento psicológico e social adequado. Para esse efeito, no decurso deste processo ocorrerão outras intervenções e articulações com outras modalidades terapêuticas, conforme a lógica do modelo integrado:
 
Consultas de Psicologia
São consultas destinadas a apoiar a pessoa com comportamentos aditivos e dependência numa fase inicial ou ao longo do seu processo de tratamento. O psicólogo e o utente avaliam aspetos concretos relacionados com a superação de obstáculos/conflitos ao nível das várias dimensões da sua vida, afetadas pela problemática vivida, e estabelecem propostas de mudança. As consultas fomentam a criação de uma relação baseada na confiança, no interesse pelo conhecimento do utente, o que permite definir mais adequadamente os objetivos de mudança, disponibilizando o reforço/suporte emocional que proporciona o alívio do sofrimento psíquico.
 
Consulta de Psicoterapias
Psicoterapias são métodos de tratamento de perturbações psíquicas através dos quais se pretende por um lado, estabilizar emocionalmente o utente, reduzindo os sintomas que manifesta, e por outro, identificar as causas do adoecer psicológico que deverão ser alvo de intervenção.
Existem vários tipos de psicoterapias baseadas em diferentes modelos teóricos e com distintas técnicas de intervenção (psicoterapias de inspiração psicanalítica, psicoterapias breves, psicoterapias sistémicas, psicoterapias comportamentais-cognitivas, psicoterapias familiares, psicoterapias de grupo, psicodrama, entre outras). Embora se diferenciem nas suas referências teóricas e técnicas, em termos gerais todas elas utilizam a relação psicoterapeuta-utente (indivíduos/ famílias) como veículo promotor de mudança, na qual se baseia a intervenção terapêutica. Diferenciam-se das consultas de psicologia, sobretudo pelas características do contrato terapêutico que deverá, entre outras coisas, definir uma regularidade pré-estabelecida (uma ou duas vezes por semana, por exemplo).Como projeto terapêutico autónomo, a psicoterapia não deverá ser indiferenciadamente indicada: tal como acontece em outros projetos terapêuticos, existem requisitos obrigatórios que deverão ser cumpridos, dada a profundidade da intervenção em causa.
 
Consulta de Enfermagem
A consulta de Enfermagem tem como objetivo facilitar os processos de transição do utente ao longo do tratamento, ajudando-a a enfrentar as dificuldades com que se depara no momento, qualquer que seja o seu estado de saúde/doença e procurando que as experiências vividas neste processo sejam promotoras de saúde e bem-estar.
Através desta consulta, o Enfermeiro colabora com o utente (doente/família) contribuindo para o alívio do seu mal-estar, prevenindo possíveis complicações de saúde decorrentes dos comportamentos aditivos e dependência, ajudando-o na gestão de tomada de medicamentos e promovendo o tratamento adequado de outras doenças associadas de que, eventualmente, o utente seja portador.
 
Consulta de crianças e jovens
Constituindo-se como um espaço de escuta e de consulta a crianças e jovens e seus familiares ou outros envolventes significativos, com comportamentos aditivos e dependências ou que se encontrem em situação de risco, no sentido de reforçar os fatores protetores e inibir os fatores de risco.
 
Consultas a grávidas
A mulher grávida tem acesso prioritário aos cuidados de saúde em consultas específicas que visam a prestação de cuidados integrados e globais, durante o período de gestação e puerpério. A intervenção decorre sempre que possível com a envolvência do companheiro e ou da família, sendo que o acompanhamento destas doentes segue uma linha de intervenção integrada com os serviços de obstetrícia, e com outros serviços considerados necessários como os Serviços Distritais da Segurança Social e as Comissões de Proteção de Crianças e Jovens em Risco.
 
Grupos de suporte terapêutico
Existem modelos diversificados de intervenção em grupo, dirigidos a diferentes populações alvo (utentes que procuram tratamento pela primeira vez, famílias, jovens experimentadores, e outros) e que podem ter objetivos diferenciados. 
Podem ser abertos ou fechados, com periodicidade definida (semanal, quinzenal ou mensal) visando suporte terapêutico enquanto intervenção única neste âmbito ou complementar a outras intervenções neste âmbito. 
 
Programa de tratamento com antagonista de opiáceos
Este programa está indicado para heroinodependentes que estejam abstinentes de consumos que revelem um nível de organização pessoal e dispondo de apoio familiar. O programa visa a abstinência do consumo de heroína e consiste na prescrição de um medicamento bloqueador dos recetores opiáceos com tempo de atuação prolongado, que em caso de consumo de heroína, impede o utente de sentir o seu efeito. Visa-se a prevenção da recaída, nomeadamente a que poderá ocorrer por impulso.
 
Programa de tratamento com agonistas opiáceos
Indicado para heroinodependentes, trata-se de um tratamento de manutenção com medicamentos opioide de efeito agonista (medicamentos morfinomiméticos) que, administrados em dose adequada, impedem  o sofrimento físico provocado pela abstinência  e a necessidade física de a consumir, ao mesmo tempo que reduzem o “craving” (desejo intenso de consumir heroína). A prescrição deste programa não deve ser colocada como primeira resposta terapêutica, a não ser quando existam indicações para que a manutenção opioide seja o tratamento de primeira linha, quando o quadro clinico global constitui uma indicação clinica para tal (ex: como o caso de cloridrato  de metadona para mulheres grávidas). Fora desse âmbito, estes programas devem ser propostos quando   outros métodos terapêuticos não se revelaram eficazes para ajudar o doente.
Para a concretização dos objetivos deste Programa Terapêutico deve ser elaborado um “Contrato Terapêutico” com regras e com uma duração determinada. No final do programa ou mesmo antes, caso se alterem as condições iniciais, a situação é reavaliada e definido o futuro da intervenção.

A admissão nestes programas resulta de uma indicação médica, definindo-se com o terapeuta de referência o modelo de administração a ser usado em cada caso. No início do Programa, o medicamento deve ser administrado diariamente e presencialmente por um elemento da equipa de enfermagem ou farmacêutico; verificando-se uma boa evolução em tratamento, e mantendo-se a supervisão clínica sobre o mesmo, pode ser dada progressivamente maior autonomia ao utente na administração do medicamento.
 
Áreas de Dia/  Centros de Dia
Os Centros de Dia são estruturas de apoio ao tratamento e à reinserção, essenciais em     determinadas fases do projeto terapêutico, que visam a ressocialização, o desenvolvimento pessoal, a aquisição e o treino de competências sociais, com vista à reinserção social dos indivíduos. Os Centros de Dia são indicados essencialmente para utentes dependentes de substâncias lícitas ou ilícitas em fase de abstinência, com suporte familiar insuficiente ou inexistente, ainda sem projeto de reinserção social e, portanto, utentes bastante vulneráveis do ponto de vista emocional. Dotados de uma variedade de formas de intervir, estas unidades especializadas potenciam e diversificam o processo terapêutico, ao mesmo tempo que constituem um ponto de ligação entre o Tratamento e a Reinserção, disponibilizando ao utente atividades terapêuticas, educativas, formativas e ocupacionais.
 
Quando a abordagem integrada do utente com comportamentos aditivos e dependência evidencia um conjunto de características e de problemas associados (tipo e gravidade) que necessitam de uma intervenção mais específica e especializada, serão mobilizadas para o processo de tratamento outro tipo de estruturas mais diferenciadas, as quais  poderão determinar períodos de internamento:

Unidades de Desabituação
São unidades de internamentos programados de curta duração (7 a 10 dias, podendo ir até 20 dias em situações de comorbilidade), onde através de uma abordagem psicofarmacológica, de apoio psicoterapêutico e educação para a saúde, se promove o tratamento do síndrome de privação em utentes que não dispõem de condições individuais ou sociais para o fazer em regime ambulatório. Nestas unidades, faz-se ainda a estabilização / ajuste da dose /transferência / descontinuação de programas de tratamento com agonista opiáceos, bem como o tratamento e estabilização de comorbilidade psiquiátrica e médica ligeira. Fazendo parte das intervenções do modelo integrado de cuidados aos utentes com comportamentos aditivos e dependências a saída de um internamento em Unidade de Desabituação pressupõe sempre a continuidade de cuidados, sendo como tal reforçado junto ao utente a necessidade de prosseguir o seu processo nas suas diferentes vertentes, desenvolvendo-se estratégias para a manutenção e melhoria da adesão às medidas terapêuticas que lhe estão prescritas, ou mesmo iniciando-se novas intervenções que visem a promoção da abstinência.
 
Comunidades Terapêuticas
São Unidades Especializadas de Tratamento Residencial de longa duração (habitualmente com a duração de 3 a 12 meses), em regime de internamento, onde através de apoio psicoterapêutico e socioterapêutico se procura ajudar à reorganização do mundo interno dos utentes, e a perspetivar o seu futuro. As Comunidades Terapêuticas são assim espaços residenciais, destinados a promover a reabilitação biopsicossocial do utente, mediante um programa terapêutico articulado em diferentes fases, sendo que a dinâmica comunitária as distingue das restantes abordagens de tratamento. Estes dispositivos terapêuticos operam com uma equipa multidisciplinar, sob supervisão psiquiátrica. Ao proporem uma rutura com o meio onde os consumidores se inserem e através de apoio especializado, têm como objetivo promover o autocontrolo sobre o consumo de drogas, desenvolver as competências pessoais e sociais, tendo em vista a autonomização do utente e a sua plena inserção social.
Visando responder de forma mais adequada aos problemas característicos de grupos de utentes mais vulneráveis, no âmbito do Tratamento em Comunidade Terapêutica estão previstos Programas Específicos que procuram responder de forma mais abrangente às suas necessidades, quer a nível terapêutico quer de reabilitação social: Jovens, Grávidas, Dependentes de Álcool, Utentes com Doença Mental Grave Concomitante, Utentes de Evolução Prolongada.
 
Unidades de Alcoologia
São unidades especializados no tratamento de perturbações relacionadas com o álcool, a quem compete prestar cuidados mais diferenciados e integrados, a utentes com problemas de consumo nocivo e de dependência do álcool, moderada a grave. Nos casos de policonsumo, as Unidades de Alcoologia dão o apoio nas situações em que o álcool for consumo predominante. Dispondo de respostas em regime ambulatório ou de internamento, estas unidades intervêm com utentes com síndrome de abuso ou dependência de álcool, seguindo as modalidades de tratamento mais adequadas a cada situação.
 
Serviços de Saúde Mental
Operando no âmbito dos cuidados de Saúde Mental, a intervenção dos Departamentos / Serviços de Psiquiatria e Saúde Mental no tratamento de utentes com comportamentos aditivos e dependências tem lugar quando existe necessidade de respostas mais diferenciadas e específicas, nomeadamente perante quadros de comorbilidade psiquiátrica mais grave, associados ao consumo de substâncias. Estes serviços dispõem de respostas em ambulatório e internamento, funcionando num modelo multidisciplinar, articulando a sua intervenção com as unidades especializadas em comportamentos aditivos e dependências, o que permite ao utente prosseguir o seu tratamento em todas as áreas que necessita.
 
Serviços de Especialidades Médico‐cirúrgicas Hospitalares
O recurso a estes serviços, frequente no âmbito do tratamento integrado dos utentes com comportamentos aditivos e dependências, decorre dos riscos e danos à saúde física que o curso da sua doença principal habitualmente acarreta. As frequentes comorbilidades físicas são alvo de intervenção destas unidades, a quem compete o tratamento, em ambulatório ou internamento, de doentes com comportamentos aditivos e dependências que necessitam de cuidados diferenciados e específicos, como é o caso das doenças infeciosas, entre outras. Condições particulares, como a gravidez e o puerpério, assumem igualmente nestes utentes uma necessidade de cuidados integrados e específicos, atendendo às suas características de maior fragilidade biopsicossocial. Funcionando de forma integrada com as unidades especializados que seguem estes utentes pelo seu problema de adição, a articulação entre serviços permite ao utente manter o seu tratamento para o seu problema aditivo, em concomitância com os cuidados de que necessita a nível da sua saúde física.
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