A evolução da intervenção em RRMD pode ser analisada
segundo três fases: numa primeira fase, esta contemplou ações de saúde pública
relativamente a substâncias ilícitas e disponibilização de metadona a
heroinómanos. Num segunda fase, focalizou-se sobretudo na população de
consumidores por via endovenosa e prevenção da transmissão do VIH/SIDA. A terceira
fase contempla a atuação no domínio da saúde pública de uma forma integrada
tanto ao nível do consumo de substâncias ilícitas como no consumo de
substâncias lícitas.
A abordagem tem consistido,
assim, em promover a mudança do comportamento dos consumidores de substâncias
psicoativas, a fim de diminuir os riscos nos casos em que não é possível
impedir o consumo ou conseguir a abstinência. Neste sentido, o modelo de intervenção, que implica frequentemente
trabalhar com pessoas com comportamentos aditivos e dependências com muitos
problemas psicossociais e enfrentar contextos problemáticos e situações
imprevisíveis, deve orientar-se por princípios como:
Abordagem holística
Considerar que existem variáveis de ordem individual e contextual que são
mediadoras das mudanças de crenças, atitudes e comportamentos relativos ao
consumo de substâncias e que importa ter em consideração na definição da melhor
estratégia de atuação com cada pessoa com comportamentos aditivos e dependência
com vista a sensibilizá-la para a eliminação de comportamentos de riscos e
adoção de comportamentos de proteção.
Abordagem de
proximidade
Intervir, no âmbito das políticas de RRMD, junto de populações específicas
de consumidores de substâncias psicoativas que não sejam efetivamente abrangidos
pelos serviços convencionais, bem como a necessidade de realizar intervenções específicas
no domínio da promoção da saúde pública, exige um esforço de valorização, de
alargamento e de aperfeiçoamento contínuo de um modelo de intervenção em proximidade.
Gradualismo
Propiciar acompanhamento e orientação na mudança, que é em regra um
processo com várias etapas com avanços e recuos, e preparar o processo de
mudança adequado às condições da pessoa, promovendo uma avaliação rigorosa, a
definição de estratégias específicas e concretizáveis, o compromisso e
favorecendo melhores expetativas de autoeficácia.
Autonomia
Salvaguardar os interesses, motivações e prioridades da pessoa, definindo
objetivos e metas em conjunto. Trata-se de uma questão ética – liberdade de
escolha e dignidade da pessoa – e técnica – as pessoas mudam apenas o que
querem mudar.
Enraizamento na
comunidade
Considerar aspetos comunitários mais próximos – normas sociais e
comportamentais entre os consumidores, natureza e estrutura das relações
sociais na rede de consumidores, contexto social e físico imediato na qual as
substâncias psicoativas são consumidas, vizinhança local e contexto no qual os
consumidores vivem no quotidiano – e outros mais abrangentes – contexto
público, político e legal do consumo, aspetos económicos, entre outros).
Cidadania
Criar condições que permitam à pessoa uma estruturação de vida com o mínimo
de dignidade, ou seja, reconhecer o consumidor como um todo, o que implica
reconhecer-lhe uma dignidade, uma humanidade enquanto indivíduo desenvolvendo
assim uma consciência de cidadania.
Diálogo
Valorizar e, em alguns casos, restaurar a importância da comunicação
pressupondo a escuta, a reflexão e a intervenção, abrindo um espaço onde se
podem colocar questões.
Relação
Privilegiar o estabelecimento de relações sociais próximas e a construção
de bases de confiança e respeito mútuas, ou seja, entender que é uma relação
diferente da relação terapêutica tradicional e que se baseia numa relação de
parceria, de ajuda e de confiança/confidencialidade.
Negociação
Constituir modelos de negociação como processo essencial para chegar a uma
intervenção que seja satisfatória e exequível para todas as partes envolvidas
(técnicos, grupo-alvo, traficantes, população em geral, promotores de eventos, parceiros,
entre outros).
Educação para a
Saúde
Focar o interesse do consumidor de drogas, habitualmente centrado nas
substâncias e no seu uso, na noção de saúde.
Mudança
Promover a alteração de comportamentos de risco e hábitos de consumo considerando,
na interação com o consumidor, aspetos como a empatia enquanto determinante
para fomentar a motivação e a mudança, a consciencialização da dissonância
entre o comportamento atual e os objetivos definidos, a importância de evitar argumentar
ou fomentar o confronto direto, a utilização da própria resistência à mudança para
gerar condições para que ela aconteça, bem como a promoção da crença de que a
pessoa pode mudar.
Acessibilidade aos
Serviços de Saúde e Sociais
Promover a aproximação e o acesso do indivíduo aos serviços de saúde e
sociais disponíveis, fornecendo informação sobre alternativas existentes, estabelecendo
e promovendo uma articulação concertada de forma a facilitar o relacionamento
do indivíduo com estes serviços.